24.2.07

felgueiral

1.
«No texto que sintetiza a matéria detectada e explica o procedimento da comissão são enumeradas 15 situações, que podem configurar crime e que vão desde: "Fraccionamento sistemático das empreitadas, sem justificação, para evitar a aplicação do concurso público, privilegiando sem razão o convite directo a um núcleo restrito de empresas"; "adulteração de base de dados da correspondência enviada", autorização "mais do que uma vez de duas propostas de lançamento da mesma empreitada com preços distintos"; "manipulação de análise de propostas"; "adjudicação a determinadas empresas por valores muito superiores ao valor real dos trabalhos" ou "facturas de trabalhos a mais no valor de 150.000 euros, em contratos de avença". » [Diário de Notícias]

Não tenhamos ilusões: as ilegalidades que estão a ser investigadas na Gebalis não diferem muito das práticas de gestão da generalidade da administração pública no país. À medida que se zangam as comadres, vão sendo conhecidos alguns casos, e em cada canto parece esconder-se mais um episódio na busca do fundo do saco azul que o nosso dinheiro anda a alimentar há demasiado tempo.

«As pessoas condenam a corrupção no abstracto, mas na prática pactuam»

Independentemente das cambalhotas processuais que os casos investigados possam vir a dar e de eventuais arguidos virem ou não a ser condenados, o que se tem vindo a passar nos últimos anos é um enorme passo em frente. Basta pensar que são esquemas em vigor há muitas décadas e só agora começamos a conhecer, de facto, o estado real da coisa pública. Quanto a condenações, também há que ter em conta que só a prática nos levará a conhecer efectivamente as diversas fomas de contornar a lei e as melhores maneiras de a corrigir.

2.
No entanto, talvez seja preciso algum tempo para que alterações nas práticas produzam os efeitos necessários para convencer a opinião pública de que muitos a roubar aos poucos levam fortunas, e de que esses actos não podem ser legitimados por haver outros a lucrar mais.

Fenómenos tipo Felgueiral explicam-se afinal facilmente, a avaliar pelo estudo sobre corrupção do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa divulgado hoje no «Público» [sem link]. Aí se conclui não haver, entre os portugueses, «preocupação pela existência de corrupção na administração local, regional ou europeia e nas pequenas e médias empresas e no meio financeiro».

O trabalho, coordenado por Luís de Sousa, indica ainda que a maioria dos inquiridos «considera como actos corruptos os comportamentos que mais se aproximam da definição penal», o que «deixa uma ampla margem de tolerância para toda uma série de práticas não reguladas ou de difícil regulação, nomeadamente conflitos de interesses, cunhas, amiguismos, favorecimentos, patronagem política, etc».

3.
Em suma: podemos estar a dar alguns passos em frente, mas ainda resta muito caminho a palmilhar.

2 comentários:

LRC disse...

O meu aplauso para este escrito. De realçar que em todos os quadrantes aparecem casos destes. Até em Salvaterra de Magos.
Pode crer, cara MCA, ainda há muito caminho para palmilhar.

MCP disse...

O dinheiro não tem côr política, caro LRC. Nós é que levamos demasiados anos sob o efeito da embriaguez da revolução, a julgar que mais para a esquerda era tudo boa gente...

De resto, muito do que nos é roubado serve para alimentar aparelhos partidários e não para engordar bolsas individuais.